quarta-feira, dezembro 03, 2008

Retiro em Plum Village

Plum Village é um lugar especial e acho que cada um encontra a sua Plum Village na França. Ao chegarmos lá, temos questões e dificuldades que nem sabemos e várias se revelam naquele ambiente transformador. A paisagem é especial nessa época do ano. As folhas de várias cores e tonalidades dão um colorido especial. Os vinhedos recém colhidos estão pelados, mas mesmo assim lindos. Tudo bastante inspirador.

As pessoas são outro fator importante. Todos que estão lá têm um compromisso com a prática e uma aspiração comum. Buscam a transformação do sofrimento através das práticas oferecidas pelos monásticos e pelos ensinamentos do Thay. Eles são um refúgio. A prática deles ajudou minha prática nos momentos difíceis e creio que eu ajudei a vários. Em Plum Village o ambiente é calmo e frequentemente somos convidados através do sino ou do relógio do refeitório a parar tudo e apenas respirar. Nada é mais importante naquele momento. Apenas respirar.

Tive muitas dificuldades no início e não conseguia me conectar com a prática nem com o local. Depois de alguns dias pude ver profundamente em mim o porquê. Toquei sementes que remontavam minha infância, pude ver comportamentos que se repetiam há décadas sem que eu percebesse e creio que me curei. Quando isso aconteceu eu passei a ver outra Plum Village. Eu passei a pertencer, passei a existir ali. A sensação de cura me despertou para muitas outras coisas.

Ao fazer working meditation na cozinha pude ver o quão árduo é esse trabalho. Quando suor e amor são necessários para preparar o que comemos. Um sentimento de verdadeira gratidão me invadia a cada refeição, lembrando dos rostos dos amigos que passaram horas na cozinha para que eu pudesse me alimentar. Olhando mais profundamente vi que ao criar um filho fazemos o mesmo. São anos de amor, carinho, preocupações e muito trabalho árduo para que um filho cresça e se lance ao mundo. Vi o quão pouco grato era a meus pais por tudo que fizeram. Publicamente em uma discussão do Dharma manifestei minha gratidão a eles e ao voltar fiz isso pessoalmente. Não só a eles, mas a meu avô que ainda está vivo.

Por fim, o ritmo lento de Plum Village cada vez me levava mais ao momento presente. Não havia muito o que fazer por lá, nem nenhum outro lugar para ir. Um dia em um almoço com o Thay na sala de meditação, ele sugeriu que pessoas oferecessem canções. Naquele instante vi que não tinha nada mais a fazer naquele dia, e nem podia sair da sala. A única coisa que havia era desfrutar das belas canções. Vivi intensamente aquele momento. “Nowhere to go, nothing to do”. Uma felicidade verdadeira brotou em mim, a felicidade de estar verdadeiramente e inteiramente no momento presente, talvez pela primeira vez na minha vida tão intensamente. Foi muito forte. As palavras da música de Plum Village fizeram todo sentido: “Happiness is here and now/ I have dropped my worries./ Nowhere to go./ Nothing to do./No longer in a hurry.”

Depois de uma semana me sinto transformado. As palavras do Thay ganharam outro significado devido a minha experiência direta. Minha confiança na prática aumentou e também sinto mais espaço interior. Meu desafio agora é levar minha Plum Village Portátil aonde quer que eu vá. Seja no trabalho, seja no trânsito, aonde que eu vá agora sei que há um lugar lá dentro onde posso encontrar a Plum Village que continua em mim. Para isso preciso nutrir constantemente essa Plum Village interior para que ela não desapareça.

8 comentários:

Unknown disse...

Quanta profundidade há neste texto!
Obrigada por compartilhar essa experiência e evidenciar o que muitas vezes a rotina da vida, desfocaliza nossa observação.

Obrigada Leonardo

Charles Machado disse...

Belíssimo texto. Da pra sentir a experiência, a vivência. A energia do contato direto é reveladora. A "pratica" desperta uma sabedoria antes não encontrada.

Um grande abraço

Charles

Kalavinka disse...

Obrigada, Leo, por compartilhar conosco sua vivência em Plum Village. Na pressa de nossas vidas muitas vezes esquecemps a importância do momento presente e a maravilha de não fazer nada para simplesmente vivê-lo em profundidade.

Unknown disse...

Leo,

Muito obrigada pelo relato - tão intenso e vivo!
Obrigada por nos transportar a Plum Village e compartilhar sua transformação conosco.
Parabéns também pelas fotos - adorei ver a paisagem e estar com amigos queridos através dos seus olhos!
Sorrisos gratos e flores de lótus,

Denise Kato
Sangha Plena Consciência - São Paulo

Reciclar é Chique e Sustentável disse...

Leonardo,
Fico muito feliz por ter a oportunidade de ler um texto como este!
Fico também muito agradecida de fazer parte do grupo que recebe de vocês, relatos e experiências tão enriquecedoras e com tanta sabedoria!

Um grande abraço, muita luz e
obrigada!
Regina

Ribamar Lopes disse...

Por um instante me reportei a Plum village e percebi a grandiosidade da sua experiência.
O seu relato nos leva a reflexão.

ana _lucia disse...

Beleza Leo!
Assim como suas fotos também demonstram o quanto você se integrou àquele lugar e vivenciou, o que pra mim ,se entende por interser.
Obrigada por repartir essa experiência..
Abraços
Ana

Nouredini disse...

Querido irmão,

singelo, forte e belo seu relato e sobretudo, nos permiti pensar " plum village portátil", bem aqui, ao nosso alcance, nas nossas mentes e corações.
obrigada irmão,
Votos de paz e harmonia a todos